19/06/2018

A minha história começa aqui

A história de António Soares Franco, CEO da José Maria da Fonseca, produtora do vinho Periquita, mistura-se com a do próprio vinho e é essa que aqui se conta na primeira pessoa.

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“Intenso. É das primeiras memórias que tenho do cheiro da sala de provas, nesta casa onde nasceu o Periquita e a José Maria da Fonseca. Eu teria uns oito ou nove anos e vinha ver aqui o meu pai, o meu tio António e outras pessoas da área da enologia, a experimentar os vinhos. Esse cheiro fazia-me alguma confusão, mas não me desagradava. Lembro-me do meu tio, que era solteirão, passar-me um copinho por detrás das costas com um fundinho para eu provar.

Foi, aliás, nesta casa que eu nasci e, desde miúdo, acompanhava o meu pai ao sábado para passear e ver trabalhar. Já tinha o bichinho do negócio, mas nunca tomei por garantido vir para aqui, apesar de me ter formado em gestão de empresas no ISEG e, desde cedo, fazer um part-time no escritório.

Formei-me nos anos da brasa, em 1975, e as perturbações políticas levaram a que não tivéssemos exames em junho e julho. Foi um ano dramático, com a prisão dos empresários e sem saber como iria ser o dia seguinte. Lembro-me de pensar que, se calhar, teria de fazer a minha vida lá fora. Naquela altura tínhamos uma sociedade com americanos – era uma empresa separada chamada José Maria da Fonseca Internacional Vinhos e que comercializava o Lancers – e foram eles que nos perguntaram o que pensávamos fazer. O meu pai disse logo que não se ia embora pois, apesar de tudo, acreditava que não iria ser preso. Mas pediu-lhes que se encarregassem dos filhos, até as coisas acalmarem. É assim que eu, já casado, vou trabalhar para o outro lado do Atlântico e durante dois anos, me especializo na área do marketing de bebidas alcoólicas. Entretanto, fui convidado para integrar a operação que tinham no Brasil mas, já estávamos em 1977, as coisas estavam mais calmas e o meu pai escreveu-me a pedir que regressasse. Assim fiz.

Voltei, mas não achei que fosse um destino que estivesse escrito desde o dia em que nasci. Foi a evolução do negócio que assim ditou. Já se sabe, os negócios têm dias bons e dias menos bons. Neste caso, podia ter evoluído para pior, podíamos ter fechado a empresa depois do 25 de abril de 1974.

Quando regressei a Portugal, fui para a área comercial da empresa mãe. Depois, trabalhei numa sociedade que tínhamos com os americanos que, até 1985, faziam as nossas exportações. Esse foi, sem dúvida, o meu maior treino. Viajava quase todas as semanas e, se não fosse a minha mulher, não sei como teria sido a educação dos meus filhos. Eles tiveram muita sorte por terem uma mãe como ela.

Entretanto, começámos a pensar em mudar a produção do vinho para outro lugar, pois, nestas instalações históricas, não tínhamos condições para fazer crescer a empresa. A resposta a essa necessidade surgiu um dia, em Wimbledon, no ano de 1994, quando os ingleses da IDV – International Distillers & Vintners Limited – lançam a bomba “sei que andam à procura de instalações, por isso propomos que comprem a nossa parte da produção de vinhos em Portugal.” Cheguei a Portugal muito entusiasmado, era um desafio enorme para todos. Negociámos durante dois anos e, quando se concluiu o negócio, demos um pulo na nossa dimensão e passámos a ficar no pódio das maiores empresas de vinho portuguesas – sem contar com o vinho do Porto. Uniram-se duas culturas, uma mais tradicional, outra mais internacional. Foi, sem dúvida, um desafio muito importante para a minha carreira profissional.

Neste momento, já estou a folgar a rédea para a sétima geração entrar. É claro que não nos afastamos de repente, nem totalmente. A minha ligação a esta atividade de uma vida, também tem a ver com a parte humana. Conheço várias famílias com muitas gerações aqui. Numa delas, sei que o bisavô tratava das vacas na quinta, o avô era guarda do portão, o pai trabalhou nos escritórios e dois dos seus filhos gémeos também já cá trabalham. No outro dia, um deles trouxe os filhos e eu fiquei a pensar se eles também virão trabalhar para cá e se eu ainda andarei por aqui, ou se será a sétima geração de uns e a quinta de outros, que se irão juntar e levar este barco adiante. O tempo o dirá.

Saiba mais em https://observador.pt/seccao/periquita/
Conteúdo produzido pelo Observador Lab.

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josé maria da fonseca